(Artigo publicado originalmente em O Ponto Base, em 26 de Maio de 2013)
Um dos pontos chave do sucesso de qualquer estratégia de alocação de ativos é saber como definir o momento de realocar os recursos. A realocação nada mais é do que o que chamei de “o pulo do gato” neste artigo. É ela que define em grande parte os resultados do portfólio no longo prazo, permitindo que possamos vender parte dos ativos que apresentam lucro, enquanto reduzimos o preço médio daqueles que apresentam prejuízos na carteira.
De nada adiantará montar um portfólio muito bem alocado sem definir de antemão quais serão os critérios para disparar as realocações. Praticar a realocação a todo momento, com base em reações à notícias e outros ruídos, pode inviabilizar o método, pela elevação dos custos operacionais. Por conta disso, é preciso ter uma definição, e segui-la à risca.
Basicamente, existem três modos de definir os melhores momentos para realocar os ativos. Vejamos.
1 – Realocação periódica
A realocação periódica, como o próprio nome já diz, significa que o investidor promoverá a realocação dos ativos em intervalos de tempo regulares.
Esse tipo de definição é bastante usado por investidores que não desejam acompanhar o mercado, as notícias, e o vai e vem das cotações. Eles simplesmente esperam o tempo passar, sem se preocupar com o que está acontecendo com os preços dos ativos. Quando o intervalo de tempo pré-definido se cumpre, eles realocam os portfólios em busca do equilíbrio original, independente do que haja acontecido no mercado.
Nos Estados Unidos, por exemplo, quando um investidor segura um ativo em carteira por mais de 365 dias, esse ativo passa a ser considerado um investimento de longo prazo. Isso faz com que a alíquota de imposto sobre ganhos de capital seja reduzida em comparação aos investimentos de curto prazo, ou seja, aqueles que são vendidos antes que esse prazo se complete.
Por conta disso, muitos investidores de longo prazo nesse país optam por realocar seus portfólios uma única vez, a cada 366 dias. Desse modo, todas as vendas que realizam acabam se encaixando dentro dessa alíquota menor de impostos.
Obviamente, esse tipo de abordagem, apesar de inteligente, nem sempre é aquele que oferece os melhores resultados em termos de timing. Afinal, as tendências não estão necessariamente atreladas ao calendário.
Não obstante, para investidores que não desejam operar timing, seja por não acreditarem que isso seja possível, ou simplesmente porque preferem usar seu tempo de outras formas, é uma ótima escolha.
Mas alguns investidores simplesmente não conseguem ficar sem acompanhar seus portfólios de forma regular, e desejam ter uma participação mais ativa na gestão. Para estes, a segunda opção pode ser mais interessante.
2 – Realocação por desvio percentual
A realocação por desvio percentual tem a matemática como base das decisões. Toda vez que uma determinada cesta de ativos cumprir um desvio percentual pré-determinado, o investidor entra em ação, vendendo os excedentes dos ativos que subiram, e realocando os recursos para as outras classes de ativos.
De quanto será esse desvio é outro ponto que cada investidor deve definir conforme suas preferências. Investidores com grandes portfólios podem querer optar por utilizar desvios menores, enquanto aqueles com menos recursos podem preferir desvios maiores, de modo que os custos operacionais não comprometam os resultados.
Conheço pessoas que realizaram estudos estatísticos com base nos dados históricos, calculando de quanto teriam sido os desvios no passado, e passaram a utilizar uma média desses desvios para definir os momentos de realocar no presente e no futuro.
Embora essa abordagem tenha uma base estatística, o que a faz parecer mais científica do que a realocação periódica, é preciso também lembrar que nem sempre o futuro repete o passado de forma idêntica. Novamente, tudo depende do conjunto de crenças e da experiência do investidor.
De todo modo, a realocação com base em desvios percentuais tende a oferecer um resultado melhor do que a realocação periódica, pelo simples fato de que o próprio mercado está dizendo quando determinada classe de ativos “subiu demais”. Lembre-se apenas de que quem vai determinar o que é “demais”, é você, ao definir de quanto será esse desvio.
Não existe um método que seja o melhor para todos. Cada investidor precisa ser bastante honesto consigo mesmo na hora de decidir que modelo prefere usar. Eu, particularmente, devido à minha experiência pessoal, e depois de ter utilizado a realocação por desvio percentual por muitos anos, acabei migrando para a terceira opção:
3 – Realocação por indicadores
A realocação por indicadores é realizada sempre que indicadores técnicos ou fundamentalistas mostram a possibilidade de reversão, ou consolidação de tendências. Esse tipo de abordagem insere um elemento de timing no modelo de alocação de ativos.
Embora possa parecer um contra-senso utilizar indicadores de timing em um modelo que prevê justamente a nossa incapacidade de lidar com ele de forma adequada, eu acredito que essa idéia faz sentido, ao menos para aqueles que tenham alguma familiaridade e confiança nesses indicadores.
O ponto em questão é que, ao utilizarmos um modelo de alocação, ficamos desobrigados de acertar o timing com precisão em todos os momentos, algo que não ocorre quando estamos 100% investidos em uma aposta direcional.
Se uma tendência ameaçar se reverter, e depois seguir intacta, o fato do investidor ter realocado os ativos naquele momento não se apresentará como um grande problema. Afinal, ele continuará exposto em todas as classes de ativos, navegando o resto da tendência. Isso ocorre porque, ao vender apenas os lotes excedentes, ele nunca liquidará todos os ativos de uma classe, mantendo sempre suas apostas em todas as direções.
Obviamente, esses indicadores devem ser ajustados para captar as tendências em prazos mais longos, novamente com a preocupação de não gerar sinais em demasia, o que elevaria os custos operacionais, prejudicando o resultado como um todo.
Divergências em gráficos semanais, desvios padrão, desvios da média móvel de 200 dias, são apenas alguns dos exemplos de indicadores técnicos que podem ser utilizados nesse caso. Existe uma grande diversidade de indicadores de todos os tipos, para todos os gostos. Novamente, não há fórmula mágica que possa servir a todos.
Basicamente, todo e qualquer tipo de indicador com o qual o investidor tenha familiaridade e confiança, pode ser utilizado. O importante é que o gestor esteja confortável com as ferramentas que escolher utilizar, e que esteja sempre considerando qual opção trará os melhores resultados sem elevar demasiadamente o número (e o custo) das operações.
Considerações finais
Avalie com atenção e cuidado cada uma das opções acima, e faça inúmeros testes hipotéticos, de modo a verificar em que tipo de filosofia de realocação você se encaixa, e qual seria a melhor escolha no seu caso.
Uma vez definida sua escolha, siga ela à risca. Evite mudar de idéia a todo momento, pois isso pode prejudicar os resultados, assim como seu controle emocional. Obviamente, redirecionamentos estratégicos são importantes, e devem ser feitos de tempos em tempos, principalmente se houver a detecção de algum problema com o seu modelo.
Porém, qualquer mudança na estratégia original só deve ser feita após todos os dados terem sido avaliados com a mesma atenção e afinco que o levaram a optar por sua primeira escolha. Decisões tomadas de forma emocional, em meio àqueles momentos de alta volatilidade, quase sempre trazem mais prejuízos do que ganhos.
O importante é saber que quando se utiliza um bom modelo de alocação de ativos, expondo seu portfólio às três principais classes de ativos, e mantendo o foco no longo prazo, a necessidade de acertar o timing e a direção do mercado já não se torna uma questão de vida ou morte.
A margem de segurança que a alocação de ativos traz ao investidor, desobrigando-o de ter que acertar o timing o tempo todo é, sem dúvida, a mais simples e mais eficaz técnica de gerenciamento de risco à sua disposição.
A partir dessa base, cada um pode desenvolver suas próprias definições de alocação, de acordo com seu perfil pessoal de risco, escolher como prefere disparar suas realocações, e modificar esse modelo conforme vai evoluindo em seu conhecimento sobre o mercado. E o melhor, é que pode realizar essa longa caminhada sem stress, e sem perder o sono.
Afinal, não há nada pior do que ter que tomar uma decisão importante depois de uma noite mal dormida.
Pratique a alocação de ativos de forma consciente, e durma o sono dos justos.
Abraço.
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