(Artigo publicado originalmente em “O Ponto Base” em 29 de Março de 2013)

Uma semana depois da publicação do artigo sobre o novo topo do Dow, ontem foi a vez do S&P 500 bater um “novo recorde histórico”. Em meio a tantas boas notícias, como andaria o nosso Ibovespa, medido em termos reais? Será que após cinco anos de pesadas intervenções, o Ibovespa já se recuperou da crise de 2008?

O gráfico abaixo mostra os últimos 19 anos de desenvolvimento do Ibovespa nominal, desde a implementação do Plano Real, até o pregão da última quarta-feira, 27 de Março de 2013.

Além de podermos observar o que nos parece ser um enorme mercado secular de alta, representado pelo grande canal de alta de longo prazo, podemos também observar diversos momentos históricos importantes para nossa análise seguinte.

Esses momentos foram marcados com 10 pontos numerados, para facilitar a localização dos eventos.

Acompanhe:

Gráfico do Ibovespa Nominal

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1 – Primeiro fundo após a estabilização do Plano Real – (1995)
2 – Topo atingido no auge da bolha dos mercados emergentes – (1997)
3 – Fundo atingido após o estouro da crise asiática, russa e brasileira – (1999)
4 – Topo atingido no auge da bolha das pontocom – (2000)
5 – Fundo atingido imediatamente após os ataques ao WTC – (2001)
6 – Fundo atingido em meio ao pessimismo pós WTC e pré guerra contra o terrorismo – (2002)
7 – Topo atingido no auge da bolha imobiliária e de crédito nos EUA – (2008)
8 – Fundo atingido após o crash da bolha de crédito nos EUA – (2008)
9 – Topo atingido após a injeção de maciços estímulos pós 2008 – (em 2010)
10 – Momento atual – (2013)

Uma imagem, dezenove anos de história, e uma única certeza: Apesar das diversas crises pelas quais passou a economia global durante as duas últimas décadas, “no longo prazo, a bolsa sempre sobe”. Afinal, cada nova crise acabou trazendo um fundo ocorrido em patamares de preços mais altos que os anteriores, assim como a cada novo topo, níveis mais altos também foram sendo atingidos. Ou assim reza a sabedoria popular.

Será mesmo?

Vamos aplicar aqui o mesmo filtro que aplicamos na avaliação do Dow Jones no artigo anterior, e deflacionar o índice pelo valor do ouro, de modo que possamos retirar do gráfico a “ilusão nominal” trazida pela perda do poder de compra da moeda.

Neste caso, usaremos o valor do grama de ouro na BM&F, contrato de 250 gramas (OZ1D):

Gráfico do Ibovespa deflacionado pelo ouro

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E eis que, observando em valores reais, o enorme canal de alta secular…desaparece, dando lugar a uma enorme congestão lateral.

Vale a pena destacar alguns fatos interessantíssimos.

Enquanto no gráfico nominal, o fundo de 2002 (ponto 6) se deu em um nível de preços muito mais alto do que o fundo pós estabilização do Plano Real (ponto 1), no gráfico deflacionado vemos os dois fundos ocorrendo no mesmo nível de valores reais.

Mais curioso ainda é observar que, em termos reais, esse mesmo fundo (2002) situa-se bem abaixo do fundo atingido na crise de 1998 (ponto 3), enquanto que, no gráfico nominal, essa percepção fica embotada pela ilusão nominal.

Os topos atingidos em 1997 (ponto 2) e 2000 (ponto 4), situam-se na mesma região de valores reais, enquanto no gráfico nominal, a impressão é novamente a de que um novo recorde histórico havia sido atingido no ano 2000. Esse fato impressiona ainda mais se percebermos que o topo registrado mais recentemente, em 2010 (ponto 9), deu-se exatamente no mesmo nível dos topos de 1997 e do ano 2000, ou seja, níveis ocorridos há mais de uma década atrás.

O único topo que ocorreu efetivamente acima de todos esses, em termos reais, foi o topo de 2008 (ponto 7), em um momento no qual o mundo todo vivia uma exuberância muito mais do que irracional, em meio aos momentos finais da bolha imobiliária e de crédito nos EUA.

E agora resta nos perguntarmos, em que nível de valores reais está o Ibovespa hoje?

Aos adeptos das ilusões nominais, a região dos 55 mil pontos está muito acima do pior momento da crise de 2008, quando o Ibovespa atingiu um patamar ao redor dos 30.000 pontos. Afinal, depois de anos de maciços estímulos em nível global, os esforços governamentais certamente surtiram algum efeito, ajudando o mercado a se recuperar. Ou assim crêem os defensores do intervencionismo.

Para o observador atento, fica óbvio que o valor real do índice hoje, situa-se exatamente no MESMO patamar do PIOR momento da crise de 2008.

Difícil acreditar que o valor real do Ibovespa hoje é o mesmo que foi atingido em outubro de 2008, após a quebra do Lehman Brothers? Olhe de novo.

Obviamente, o Ibovespa é apenas um dos termômetros que utilizamos, e não representa toda a realidade do mercado. Devemos lembrar que é um índice onde Petrobrás e Vale ainda têm um peso muito grande em relação a outros ativos, portanto, o desempenho particular destes dois ativos influencia o índice de maneira determinante, tanto nos movimentos de alta, como nos de baixa.

O ponto aqui é que os governos e bancos centrais seguem mentindo, maquiando, e praticando o jogo das ilusões monetárias, e ainda convencem a grande maioria das pessoas de que todo esse esforço realizado com dinheiro público vale a pena.

Por seu lado, o investidor médio segue repetindo para si mesmo o mantra de que “no longo prazo, a bolsa sempre sobe”, como que para se convencer de que o investimento passivo no índice é um excelente negócio.

Mas para o observador atento, fica claro que toda essa pirotecnia intervencionista, que apresenta um altíssimo custo para os contribuintes, tem sido completamente ineficaz em criar valor real para investidores passivos no índice.

Quem tem olhos de ver, que veja.